No meio da
tarde, quando o efeito tyndall adentrava a lateral da minha sala de estar, pus
em prática o meu costumeiro jeito índio de sentar-me diante do computador.
Acionei
os botões que o colocava em funcionamento, enquadrei a cadeira no assoalho,
entre um mosaico e outro, e dispus as nádegas numa cômoda posição, de forma, eu
diria, erótica.
Esperei,
tranqüilamente, as janelas cibernéticas se descortinarem a minha frente,
enquanto um simpático programa de comunicação instantânea saudava-me com um
“oi!”. Respondi , de imediato, aquele apelo de praxe e retruquei um outro “oi?”
desconcertado e interrogativo, por não reconhecer o endereço eletrônico de quem
“navegava” do outro lado.
Encetamos
o diálogo simbólico com assuntos incomuns (para mim), pois o digitador com quem
falava tecia comentários sobre armas nucleares. E esta não era uma boa deixa
para principiar um diálogo informal, em se tratando de rede de comunicação
virtual cujo propósito é estimular a busca por novos amigos.
O
assunto fluiu diferente, logo que comentei, sem nenhuma intenção, que o calor
do Nordeste chegava a quase 40 graus. O homem, sem identidade definida,
perguntou-me o que eu fazia para resistir à alta temperatura da região. E, sem
pestanejar, pois considero a nudez natural, respondi: “se o tempo se faz
quente, tiro a roupa, viro índia”. Ele riu da situação com os símbolos:
“rsrsrsrsrsrsrs” e arriscou um bom comentário: “você deve se sentir livre sem
roupa, não é?”
Não
me importando e até considerando interessante a temática, incitei a conversa,
dizendo que as peças que me cobriam, naquele momento, se espalhavam pelo
tapete, poltrona ou chão. Ele, surpreso, com a resposta, escreveu um
“nossa!!!!” carregado de exclamações como a me dizer que tomara um choque, no bom
sentido, é claro!
No
meio da comunicação, ele foi me provocando com expressões pouco sutis e eu, que
não vejo maldade em certas coisas, e adorando a libidinagem verbal, retribuí
com frases picantes.
De
repente, minhas partes íntimas começavam a molhar-se a cada palavra obscena
digitada naquela máquina pálida que, diante de mim, figurava a idéia de
realidade. Perguntei-lhe o nome; Eros, respondeu. E o seu? Helena. Não a de
Tróia, naturalmente. O diálogo febril esfriou um pouco nesse momento de apresentação
informal, contudo não apagou o fogo que crepitava nas vias cibernéticas, pois o
outro me dizia que seu pênis queria saltar da calça e que precisava disfarçar.
A
conversa digitalizada ganhava de presente inúmeras reticências. Parei por
alguns instantes para prender os cabelos, pois os fios, já úmidos do calor
destas estâncias seridoenses, se misturavam no meu pescoço, causando um certo
incômodo. Então eu os amarrei num gesto quase sensual e ao mesmo tempo
mecânico.
O
cavalheiro, de pseudônimo Eros, confessou-me estar num local inapropriado para
aquela atividade de cunho ou “punho” sexual, pois havia outros navegadores por
ali e, portanto, seria uma indelicadeza de sua parte sair do ambiente, com o
pênis ereto, mas que se deslocaria ao banheiro e logo retornaria à conversa.
Enquanto
ele se organizava, eu tecia a seguinte cena:
“Ele
entrou no banheiro, abriu o zíper e me imaginou índia. Talvez uma daquelas de
cabelos negros-azulados e de peitos redondos, sem pêlos e olhos expressivamente
ambíguos”.
Pensei ainda
que a imagem construída de mim ganhara um arquivo na pasta ‘meus
documentos’cujo título seria: ‘top secret’. Ou, na pior das hipóteses, vamos
para o ‘lixo eletrônico’.
Ele
voltou. Desta vez tácito como se sentisse um certo alívio. Dirigiu-se a mim,
dizendo; “olá, querida”, justamente na hora em que uma pane nas conexões apagou
a minha resposta. E eu, meu caro leitor, fiquei entre o silêncio e a vontade de
falar. A ligação não foi restabelecida, o sinal resolveu ocultar-se nas esferas
celestiais e, enquanto o sistema voltava, meu marido chegou. Sem que ele
percebesse, fui ao banheiro e me vesti. Tudo acabou em segundos, da mesma forma
como começou, porém, ainda há um dado importante: meu marido resolveu tomar
banho e eu o ajudei a esponjar as costas. Nessa brincadeira “infantil” dançamos
em volta da fogueira, naquele espaço estreito tornando-nos índios verdadeiros.
Maria Maria Gomes
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Água de chocalho para todos!